top of page

A importância da conservação da biodiversidade genética em plantas medicinais: O gênero Croton

  • Foto do escritor: Pedro Fernando Vilanova Ferreira
    Pedro Fernando Vilanova Ferreira
  • 17 de jun. de 2021
  • 6 min de leitura

(Imagem: Alex Popovkin, 2014) A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que, aproximadamente, 80% da população mundial concentrada em países considerados em desenvolvimento dependem, em algum grau, de plantas medicinais para suas necessidades de tratamento de saúde primário (SALATINO et al., 2007). No Brasil, é sabido que a Caatinga é uma região rica e abundante em plantas medicinais, e que estas plantas são amplamente utilizadas na medicina tradicional, com vários estudos demonstrando a diversidade de metabólitos secundários encontrados nestas espécies (ALBUQUERQUE et al., 2020).

As plantas, em geral, sintetizam metabólitos, moléculas que desenvolvem papel crucial no desenvolvimento e manutenção do organismo. Estas moléculas podem ser classificadas em metabólitos primários e secundários, sendo que os primários possuem papel vital na manutenção dos processos básicos de vida, como, por exemplo, aqueles envolvidos nos processos de respiração celular (MACEDO et al., 2012). Já os secundários tem papel, por exemplo, na proteção a estresses bióticos (por exemplos defesa contra patógenos) ou abióticos (como condições ambientais adversas). São esses mesmos compostos que podem apresentar propriedades nutricionais ou farmacológicas. Sabe-se que as substâncias ativas de plantas medicinais são primariamente compostas por metabólitos secundários, moléculas extremamente complexas e produzidas em baixas concentrações (MACEDO et al., 2012). Na Caatinga, acredita-se que a produção destes metabólitos nas plantas seja favorecida no ambiente e condições adversas em que elas se encontram, influenciando as rotas de biossíntese de compostos associados com a defesa contra estresses abióticos, ou seja, advindos de fatores físicos e químicos do ambiente (ALBUQUERQUE et al., 2020).

Pesquisas evidenciam que este bioma é altamente diverso e lar de muitas espécies endêmicas (ALVES et al., 2012), ou seja, espécies de restrita ocorrência geográfica. Entretanto, regiões que possuem uma alta dependência de recursos naturais e atividades de extração são, geralmente, acompanhadas de uma acentuada perda de biodiversidade em ecossistemas frágeis (ALVES et al., 2012). Por esta razão, os recursos genéticos destas plantas podem ser perdidos, juntamente com o potencial funcional de suas moléculas, o que inclui os potenciais fitoterapêuticos (BRITO et al., 2021). Idealmente devemos promover a manutenção da biodiversidade natural, e combater fortemente a destruição voluntária de ecossistemas no nosso país. Entretanto, em algumas situações, uma alternativa viável é a conservação ex situ, ou seja, um conjunto de estratégias de preservação do patrimônio da espécie fora de seu ambiente natural (JOSÉ et al., 2019). Utiliza-se conservação ex situ para mitigação da perda de recursos genéticos quando o habitat do organismo em questão está sob forte pressão devido à destruição e fragmentação, assim como no advento de mudanças climáticas (JOSÉ et al., 2019). Uma destas estratégias de conservação é o estabelecimento de Bancos Ativos de Germoplasma (BAGs), onde espécies podem ser colecionadas e sua variabilidade genética caracterizada e conservada. Desta forma, os genes são armazenados e o BAG pode representar a diversidade genética que existe nas populações naturais daquela espécie (BRITO et al., 2021). A diversidade genética é vital, pois é necessário entendermos as redes metabólicas que levam à produção de substâncias desejadas e como estas redes são reguladas. Desta forma, genes, e outras moléculas que controlam a biossíntese de substâncias ativas precisam ser identificados para que possamos aumentar a produção de plantas ou metabólitos secundários que sejam de importância medicinal (MACEDO et al., 2012).

Um grupo de plantas conhecido por seu uso medicinal tradicional nos trópicos, onde sua maior concentração está na região Nordeste do Brasil, especialmente no bioma da Caatinga, é o gênero Croton pertencente à família Euphorbiaceae (ALVES et al., 2012). Os inúmeros usos de espécies do gênero se estendem para medicina popular e tradicional de países como Colômbia, Brasil, Equador, Peru, México, entre outros (BARRERA, et al. 2016). No Brasil, por volta de 300 espécies são consideradas endêmicas ao país, e apesar de toda diversidade e potencial, estudos relacionados à conservação ex situ e in situ ainda são escassos. Das 400 espécies registradas no Brasil, muitas evocam interesse por suas propriedades farmacológicas e químicas que são bioativas em inúmeras formas (ALVES et al., 2012), sendo que a alta diversidade dos efeitos descritos é um reflexo da alta diversidade química das Euphorbiaceae (SALATINO et al., 2007). O perfil químico do gênero é bastante diversificado no que diz respeito aos metabólitos secundários, como alcaloides, flavonoides e terpenóides (ALMEIDA-PEREIRA et al., 2019). Dentre os diversos efeitos das propriedades do gênero Croton estão o uso de substâncias anti-inflamatórias e contra processos oxidativos, ferimentos estomacais e de pele, hipertensão, antibióticos, antimaláricos, anticarcinogênicos, entre incontáveis outros (ALVES et al., 2017; SALATINO et al., 2007). Além disso, extratos de óleos essenciais, substâncias orgânicas voláteis, de plantas deste gênero também apresentaram potenciais bioativos como atividade antinociceptiva (ALVES et al., 2012), que, segundo Felippotti (2005), “antinocicepção é descrita como redução na capacidade de perceber a dor”. O desenvolvimento de uma formulação baseada em óleos essenciais utilizando uma espécie do gênero Croton já foi, inclusive, patenteada (ALMEIRA-PEREIRA et al., 2017).

Os fatores ambientais e genéticos podem alterar a produção de metabólitos secundários e, consequentemente, a composição química de óleos essenciais. A produção destes óleos é uma característica quantitativa, ou seja, é controlada por muitos genes e tem forte influência ambiental (ALMEIDA-PEREIRA et al., 2019). Assim, é essencial que se tenha conhecimento da estrutura genética para seleção e melhoramento de cultivares de interesse medicinal, mas além disso, compreender como a diversidade genética está estruturada nestas populações naturais para se desenvolver um entendimento da bioquímica envolvida na biossíntese destes metabólitos secundários e, também, isolar os diferentes genes que estão envolvidos em diferentes estágios da síntese destes compostos (BRITO et al., 2021).

Apesar de todas as características essenciais e o seu potencial de uso, poucos estudos genéticos têm sido conduzidos com espécies do gênero Croton e esta informação genética será essencial no estabelecimento de programas de conservação, além do uso sustentável e do melhoramento de espécies potencialmente importantes (ALVES et al., 2012).

Sugestão de leitura:

Para entender a importância da biodiversidade e como o estudo genético está envolvido nesse processo, o GEPLAM recomenda a leitura do artigo “Low diversity in the native populations of Croton tetradenius Baill. when using SNP markers: a future crop with an insecticidal activity.” de autoria de Fabiany de Andrade Brito com coautoria de Maria de Fátima Arrigoni-Blank juntamente com Arie Fitzgerald Blank, todos da Universidade Federal do Sergipe, além de coautoria de Maria Imaculada Zucchi , José Baldin Pinheiro, Gabriel Dequigiovanni, Carolina Grando, Carlos Eduardo Batista, pesquisadores do Departamento de Genética da ESALQ/USP e Alessandro Alves-Pereira da Universidade de Campinas. O objetivo do trabalho foi estimar a diversidade genômica de populações de Croton tetradenius através de SNPs para serem incluídas no Banco de Germoplasma de Plantas Medicinais e Aromáticas da Universidade Federal do Sergipe.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:


ALBUQUERQUE, U. P. et al. Medicinal plants and animals of an important seasonal dry forest in Brazil. Ethnobiology and Conservation, v. 9, p. 1–53, 2020.

ALMEIDA-PEREIRA, C. S. et al. Genetic diversity of native populations of Croton tetradenius Baill. using ISSR markers. Genetics and Molecular Research, v. 16, n. 2, 18 maio 2017.

ALMEIDA-PEREIRA, C. S. et al. Chemical composition and antimicrobial activity of essential oils of a Croton tetradenius Baill. germplasm. Journal of Essential Oil Research, v. 31, n. 5, p. 379–389, 2019.

ALVES, M; ARAÚJO, M. de. F. L.; GUSMÃO, C. L. S.; NETO, A. de. C. L.; CARVALHO, R. de.; BENKO-ISOPPEN, A. M. Diversity and Uses of the Genus Croton (Euphorbiaceae) in Northeastern Brazil. In: CORDELL, G. A.; MARINOFF, M.; MARTÍNEZ, J. L.; RAI, M.; RASTRELLI, L. Medicinal Plants: Biodiversity and Drugs. 1.ed. New York: CRC Press, 2012.

BARRERA, C. A. C; CONSTANZA GOMEZ, Diana; CASTIBLANCO, Fabio Andrés. Importancia medicinal del género Croton (Euphorbiaceae). Revista Cubana de Plantas Medicinales, Ciudad de la Habana, v. 21, n. 2, p. 234-247, jun. 2016.

BRITO, F. de A. et al. Low diversity in the native populations of Croton tetradenius Baill. when using SNP markers: a future crop with an insecticidal activity. Genetic Resources and Crop Evolution, p. 1–15, 2 abr. 2021.

FELIPPOTTI, Tatiana Tocchini. Envolvimento de receptores opióides µ1 e das redes neurais do colículo inferior na analgesia pós-ictal. 2005. Dissertação (Mestrado em Neurologia) - Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, 2005.

JOSÉ, S. C. B. R. et al. Conservação Ex Situ de Recursos Genéticos. In: PAIVA, S. R.; ALBUQUERQUE, M. do S. M.; SALOMAO, A. N.; JOSE, S. C. B. R.; MOREIRA, J. R. de A. (Ed.). Recursos genéticos: o produtor pergunta, a Embrapa responde. Brasília, DF: Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, 2019.

MACEDO, A, F.; MACEDO, L. F. Developing Better Herbal Medicines in the Post-Genomic Era. In: CORDELL, G. A.; MARINOFF, M.; MARTÍNEZ, J. L.; RAI, M.; RASTRELLI, L. Medicinal Plants: Biodiversity and Drugs. 1.ed. New York: CRC Press, 2012.

SALATINO, A.; SALATINO, M. L. F.; NEGRI, G. Traditional uses, chemistry and pharmacology of Croton species (Euphorbiaceae). Journal of the Brazilian Chemical Society, v. 18, n. 1, p. 11-33, 2007.

 
 
 

1 Comment


Anna Beatriz Queiroz Di Souza
Anna Beatriz Queiroz Di Souza
Jun 17, 2021

Assunto extremamente importante! Parabéns pela escrita!

Like

GEPLAM - Grupo de Extensão e Pesquisa de Plantas Medicinais 

bottom of page